23 novembro 2014

Mundo Caduco

Escrever coisas relacionada a literatura é algo prazeroso para mim. Nesse mês e nesse post venho compartilhar dois poemas que dialogam entre-si e dizem muito para nós. Um Português e um Brasileiro narrando de forma poética e com tal profundidade a nossa atualidade. 
Carlos Drummond de Andrade e Fernando Pessoa presenteia os apaixonados por literatura e exercício filosófico com Elegia 1938 e Ode Triunfal.

                Elegia 1938

                         Trabalhas sem alegria para um mundo caduco, 
                        onde as formas e as ações não encerram nenhum exemplo.

                      Praticas laboriosamente os gestos universais,
                      sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.
                            Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
                       e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
                    À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
                      ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.
                   Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
                     e sabes que, dormindo, os problemas te dispensam de morrer.
                    Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
                e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.
                 Caminhas entre mortos e com eles conversas
                    sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
                 A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
                      Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.
                   Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
              e adiar para outro século a felicidade coletiva.
                    Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
                        porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.
                    Carlos Drummond de Andrade


Ode Triunfal
 À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica 
Tenho febre e escrevo. 
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, 
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos. 

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno! 
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria! 
Em fúria fora e dentro de mim, 
Por todos os meus nervos dissecados fora, 
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto! 
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, 
De vos ouvir demasiadamente de perto, 
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso 
De expressão de todas as minhas sensações, 
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! 

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical — 
Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força — 
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro. 
Porque o presente é todo o passado e todo o futuro 
E há Platão e Virgíllo dentro das máquinas e das luzes eléctricas 
Só porque houve outrora e foram humanos Virgílio e Platão, 
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinqüenta, 
Átomos que hão-de ir ter febre para o cérebro do Ésquilo do século cem, 
Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes,
Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando, 
Fazendo-me um excesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma. 

Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime! 
Ser completo como uma máquina! 
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo! 
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, 
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento 
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões 
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável! 
Fraternidade com todas as dinâmicas! 
Promíscua fúria de ser parte-agente 
Do rodar férreo e cosmopolita 
Dos comboios estrênuos. 
Da faina transportadora-de-cargas dos navios. 
Do giro lúbrico e lento dos guindastes, 
Do tumulto disciplinado das fábricas, 
E do quase-silêncio ciciante e monótono das correias de transmissão! 
Horas européias, produtoras, entaladas 
Entre maquinismos e afazeres úteis! 
Grandes cidades paradas nos cafés, 
Nos cafés — oásis de inutilidades ruidosas 
Onde se cristalizam e se precipitam 
Os rumores e os gestos do Útil 
E as rodas, e as rodas-dentadas e as chumaceiras do Progressivo! 
Nova Minerva sem-alma dos cais e das gares! 
Novos entusiasmos de estatura do Momento! 
Quilhas de chapas de ferro sorrindo encostados às docas, 
Ou a seco, erguidas, nos planos-inclinados dos portos! 
Atividade internacional, transatlântica, Canadian-Pacific! 
Luzes e febris perdas de tempo nos bares, nos hotéis, 
Nos Longchamps e nos Derbies e nos Ascots, 
E Piccadillies e Avenues de l'Opéra que entram 
Pela minh'alma dentro! 

Hé-lá as ruas, hé-lá as praças, hé-lá-hô la foule! 
Tudo o que passa, tudo o que pára às montras! 
Comerciantes; vários; escrocs exageradamente bem-vestidos; 
Membros evidentes de clubes aristocráticos; 
Esquálidas figuras dúbias; chefes de família vagamente felizes 
E paternais até na corrente de oiro que atravessa o colete 
De algibeira a algibeira! 
Tudo o que passa, tudo o que passa e nunca passa! 
Presença demasiadamente acentuada das cocotes 
Banalidade interessante (e quem sabe o quê por dentro?) 
Das burguesinhas, mãe e filha geralmente 
Que andam na rua com um fim qualquer; 
A graça feminil e falsa dos pederastas que passam, lentos; 
E toda a gente simplesmente elegante que passeia e se mostra 
E afinal tem alma lá dentro! 

(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!) 

A maravilhosa beleza das corrupções políticas, 
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos, 
Agressões políticas nas ruas, 
E de vez em quando o cometa dum regicídio 
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus 
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana! 


Notícias desmentidas dos jornais, 
Artigos políticos insinceramente sinceros, 
Notícias passez à-la-caisse, grandes crimes — 
Duas colunas deles passando para a segunda página! 
O cheiro fresco a tinta de tipografia! 
Os cartazes postos há pouco, molhados! 
Vients-de-paraître amarelos como uma cinta branca! 
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos, 
Como eu vos amo de todas as maneiras, 
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfato 
E com o tacto (o que palpar-vos representa para mim!) 
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar! 
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós! 

Adubos, debulhadoras a vapor, progressos da agricultura! 
Química agrícola, e o comércio quase uma ciência! 
Ó mostruários dos caixeiros-viajantes, 
Dos caixeiros-viajantes, cavaleiros-andantes da Indústria, 
Prolongamentos humanos das fábricas e dos calmos escritórios! 

Ó fazendas nas montras! ó manequins! ó últimos figurinos! 
Ó artigos inúteis que toda a gente quer comprar! 
Olá grandes armazéns com várias seções! 
Olá anúncios eléctricos que vêm e estão e desaparecem! 
Olá tudo com que hoje se constrói, com que hoje se é diferente de ontem! 
Eh, cimento armado, beton de cimento, novos processos! 
Progressos dos armamentos gloriosamente mortíferos! 
Couraças, canhões, metralhadoras, submarinos, aeroplanos! 

Amo-vos a todos, a tudo, como uma fera. 
Amo-vos carnivoramente, 
Pervertidamente e enroscando a minha vista 
Em vós, ó coisas grandes, banais, úteis, inúteis, 
Ó coisas todas modernas, 
Ó minhas contemporâneas, forma atual e próxima 
Do sistema imediato do Universo! 
Nova Revelação metálica e dinâmica de Deus! 

Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks, 
ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes — 
Na minha mente turbulenta e encandescida 
Possuo-vos como a uma mulher bela, 
Completamente vos possuo como a uma mulher bela que não se ama, 
Que se encontra casualmente e se acha interessantíssima. 

Eh-lá-hô fachadas das grandes lojas! 
Eh-lá-hô elevadores dos grandes edifícios! 
Eh-lá-hô recomposições ministeriais! 
Parlamentos, políticas, relatores de orçamentos, 
Orçamentos falsificados! 
(Um orçamento é tão natural como uma árvore 
E um parlamento tão belo como uma borboleta.) 

Eh-lá o interesse por tudo na vida, 
Porque tudo é a vida, desde os brilhantes nas montras 
Até à noite ponte misteriosa entre os astros 
E o mar antigo e solene, lavando as costas 
E sendo misericordiosamente o mesmo 
Que era quando Platão era realmente Platão 
Na sua presença real e na sua carne com a alma dentro, 
E falava com Aristóteles, que havia de não ser discípulo dele. 

Eu podia morrer triturado por um motor 
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída. 
Atirem-me para dentro das fornalhas! 
Metam-me debaixo dos comboios! 
Espanquem-me a bordo de navios! 
Masoquismo através de maquinismos! 
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho! 

Up-lá hô jockey que ganhaste o Derby, 
Morder entre dentes o teu cap de duas cores! 

(Ser tão alto que não pudesse entrar por nenhuma porta! 
Ah, olhar é em mim uma perversão sexual!) 

Eh-lá, eh-lá, eh-lá, catedrais! 
Deixai-me partir a cabeça de encontro às vossas esquinas, 
E ser levado da rua cheio de sangue 
Sem ninguém saber quem eu sou! 

Ó tramways, funiculares, metropolitanos, 
Roçai-vos por mim até o espasmo! 
Hilla! hilla! hilla-hô! 
Dai-me gargalhadas em plena cara, 
Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas, 
Ó multidões quotidianas nem alegres nem tristes das ruas, 
Rio multicolor anónimo e onde eu me posso banhar como quereria! 
Ah, que vidas complexas, que coisas lá pelas casas de tudo isto! 
Ah, saber-lhes as vidas a todos, as dificuldades de dinheiro, 
As dissensões domésticas, os deboches que não se suspeitam, 
Os pensamentos que cada um tem a sós consigo no seu quarto 
E os gestos que faz quando ninguém pode ver! 
Não saber tudo isto é ignorar tudo, ó raiva, 
Ó raiva que como uma febre e um cio e uma fome 
Me põe a magro o rosto e me agita às vezes as mãos 
Em crispações absurdas em pleno meio das turbas 
Nas ruas cheias de encontrões! 

Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma, 
Que emprega palavrões como palavras usuais, 
Cujos filhos roubam às portas das mercearias 
E cujas filhas aos oito anos - e eu acho isto belo e amo-o! — 
Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escadas. 
A gentalha que anda pelos andaimes e que vai para casa 
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão. 
Maravilhosa gente humana que vive como os cães, 
Que está abaixo de todos os sistemas morais, 
Para quem nenhuma religião foi feita, 
Nenhuma arte criada, 
Nenhuma política destinada para eles! 
Como eu vos amo a todos, porque sois assim, 
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus, 
Inatingíveis por todos os progressos, 
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida! 

(Na nora do quintal da minha casa 
O burro anda à roda, anda à roda, 
E o mistério do mundo é do tamanho disto. 
Limpa o suor com o braço, trabalhador descontente. 
A luz do sol abafa o silêncio das esferas 
E havemos todos de morrer, ó pinheirais sombrios ao crepúsculo, 
Pinheirais onde a minha infância era outra coisa 
Do que eu sou hoje... ) 

Mas, ah outra vez a raiva mecânica constante! 
Outra vez a obsessão movimentada dos ônibus. 
E outra vez a fúria de estar indo ao mesmo tempo dentro de todos os comboios 
De todas as partes do mundo, 
De estar dizendo adeus de bordo de todos os navios, 
Que a estas horas estão levantando ferro ou afastando-se das docas. 
Ó ferro, ó aço, ó alumínio, ó chapas de ferro ondulado! 
Ó cais, ó portos, ó comboios, ó guindastes, ó rebocadores! 

Eh-lá grandes desastres de comboios! 
Eh-lá desabamentos de galerias de minas! 
Eh-lá naufrágios deliciosos dos grandes transatlânticos! 
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali, acolá, 
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões, 
Ruído, injustiças, violências, e talvez para breve o fim, 
A grande invasão dos bárbaros amarelos pela Europa, 
E outro Sol no novo Horizonte! 

Que importa tudo isto, mas que importa tudo isto 
Ao fúlgido e rubro ruído contemporâneo, 
Ao ruído cruel e delicioso da civilização de hoje? 
Tudo isso apaga tudo, salvo o Momento, 
O Momento de tronco nu e quente como um fogueiro, 
O Momento estridentemente ruidoso e mecânico, 
O Momento dinâmico passagem de todas as bacantes 
Do ferro e do bronze e da bebedeira dos metais. 

Eia comboios, eia pontes, eia hotéis à hora do jantar, 
Eia aparelhos de todas as espécies, férreos, brutos, mínimos, 
Instrumentos de precisão, aparelhos de triturar, de cavar, 
Engenhos, brocas, máquinas rotativas! 

Eia! eia! eia! 
Eia electricidade, nervos doentes da Matéria! 
Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente! 
Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez! 
Eia todo o passado dentro do presente! 
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia! 
Eia! eia! eia! 
Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita! 
Eia! eia! eia! eia-hô-ô-ô! 
Nem sei que existo para dentro. Giro, rodeio, engenho-me. 
Engatam-me em todos os comboios. 
Içam-me em todos os cais. 
Giro dentro das hélices de todos os navios. 
Eia! eia-hô! eia! 
Eia! sou o calor mecânico e a electricidade! 

Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa! 
Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas a trabalhar, eia! 

Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá! 

Hup-lá, hup-lá, hup-lá-hô, hup-lá! 
Hé-la! He-hô! Ho-o-o-o-o! 
Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z! 

Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!


Álvaro de Campos (Heterônimo de Fernando Pessoa)


Dois poemas que refletem nossa vida onde as maquinas e objetos tomaram o lugar do homem, que como Marx fala o homem sofre a coisificação, não somos o que somos, somos o que temos, somos o nosso trabalho, somos o nosso status. 
Literatura é descortinar a cortina da ignorância, é da luz ao pensamento e definitivamente Pessoa e Drummond fazem isso perfeitamente ao mostrar e chocar nós mesmos com nossa realidade de neblina e r-r-r-r-r's eternos que rodeia nosso mundo caduco.

22 novembro 2014

Carta do Editor - Mês #6 Litteris

Novembro Negro, Azul, Dourado... Este mês veio com várias propostas, tantas propostas que ficamos sem norte. O que falar neste mês tão demarcado? Nesta dúvida o tempo passou, a propósito, nos resta apenas uma semana. Neste sentido, vamos quebrar a lógica das cores e pensar em representar o abstrato de uma forma significativa: Litteris.
Letras, Literatura, Lirismo. A partir deste marco temporal, ocuparemos nosso espaço levantando as bandeiras da poesia, seja já produzida, que nós produzimos e que você produziu e quer nos mandar.
Poemas, contos, crônicas, relatos; "Não quero saber do lirismo que não é libertação". (Manuel Bandeira)
O poeta é uma espécie em extensão.
Poeta, enfrente verso.


Eu Me Chamo Antonio

24 outubro 2014

Por que a grande vencedora dessa eleição foi a zueira

Desde o ano passado, por conta dos protestos que moveram o Brasil no meio do ano e como eles foram diretamente influenciados pela internet, muito se especula como seria a participação dessas mesmas ferramentas no período eleitoral. "Quero ver nas urnas", foi dito por muitos que descreditaram a integridade política daquele bando de gente vindo do Facebook - ou que ao menos tentaram. A participação da internet no processo eleitoral, claramente, nunca antes na história desse país foi tão ativa e construtiva, no sentido literal da palavra, mas em meio a tantas discussões pessoais e acusações, uma forma de expressão foi o grande destaque dessa eleição.



Antes quero dizer que por zueira eu não digo só memes, que de tão importantes alguns são até temas desse post. Mas desde já quero deixar claro que piadas ou montagens ou vídeos que não necessariamente seguem a um padrão e que constroem humor e descontração fazem parte desse universo que estamos chamando de zueira. O Brasil, aliás, tem uma forma muito específica de lidar com humor na internet, os próprios caras do Meme Factory já perceberam isso, ou seja, a zueira é mesmo nossa e ninguém tasca.


O principal fator que fez essa expressão de humor tão importante foi que ela foi a única forma eficiente de usar ironia como discussão política nessa eleição (e pelo menos em muitas). Ironia é, sem dúvida uma das formas de crítica social mais celebradas, justamente por ter a capacidade de ser ácida mas divertida ao mesmo tempo. Nos EUA, por exemplo, isso já é uma realidade. Shows como o Saturday Night Live, que fazem esquetes inteiros sobre assuntos e notícias recentes, entre elas com política, e sites como o The Onion, de notícias-sátira, são formas estáveis e aceitas culturalmente. No Brasil, isso não rola. A grande mídia acaba se isentando dessa responsabilidade não só no humor, mas também no jornalismo, que em grande parte acaba escolhendo um lado, mas querem mostrar imparcialidade. Com exceção de revistas como Veja e Carta Capital, de lados bem definidos, poucas mídias no país vão fundo em posicionamento.

E, é bom dizer: ainda bem. Crítica social através da mídia, principalmente a partir do humor, apesar de ser algo que precisa passar a acontecer, não deve ser feito irresponsavelmente e requere muita habilidade. Imagine só o Zorra Total fazendo o Weekly Uptade, ou o Danilo Gentili tentando comentar sobre jogos políticos como o Colbert. Não sei vocês, mas eu prefiro não. Nesse caso, acaba sobrando para a internet.



O mais interessante é ver como a zueira aproximou o eleitor, ao menos o que já que se encontrava no Facebook, Twitter e/ou WhatsApp, do interesse pelo assunto e acabou por simplificar a política. Esse meme de cima, um dos mais recorrentes no período e que você deve ter visto em sua timeline, é uma prova disso. Pra quem não sabe, o meme tem sempre características que quem quer que seja adiciona seu toque e distribui. O meme Tenso usa a aproximação da imagem, a imagem você seleciona. O meme da Nana Gouveia você precisa daquela espefícica foto dela e de um fundo trágico, a partir daí sua criatividade que manda. No caso do meme dos precidenciáveis você escolhia um tema e tinha que adequar as respostas a uma às repetitivas coisas que cada candidato dizia. Ou seja: pra entender e participar do meme, você precisava também entender, mesmo que de forma bem superficial, o que cada um dos candidatos representava.



O resultado direto disso foi o crescimento que os candidatos nanicos tiveram na mídia esse ano. Todo ano os candidatos que porcentagem de uma casa ou menos das intenções era simplesmente descartado do cenário, e mesmo nesse ano foi, quando apenas 4 candidatos apareceram no Jornal Nacional (ainda tentando entender o critério usado para selecionar Everaldo, mas ok). Mas, a partir do momento que a internet começou a mostrar simpatia por Luciana e Eduardo, principalmente, a mídia começou a abrir os olhos para outros candidatos. A partir daí, quem tinha destaque era não quem tinha campanhas melhores ou mais dinheiro, mas justamente quem se destacasse, pra bem ou pra mal. Levy Fidelix, por exemplo, mesmo sendo quase zero sua influência nas urnas, quando fez declarações homofóbicas no meio do debate virou o centro das atenções no dia seguinte, enterrando sua campanha de vez.

Depois de Marina mudando de ideia, Dilma querendo dizer o que não disse, Luciana Solitária, Eduardo sendo fofo no Twitter, Bonner sendo Bonner, Candidatos sendo elenco do Chaves e piadas sobre aerotrem, água, cocaína, privatização, maconha, não ter nada a ver com isso, aparelho excretor, papéis de tema, urna e até um romance fictício de Luciana e Eduardo (TEM FANFIC!!!), fica evidente que o jovem brasileiro, que foi por mundo tempo acusado se ser ignorante para a política, percebe muito melhor o significado das representações políticas e dá muito mais atenção a eventos e discursos que ocorrem, provando que o gigante aparentemente ainda está acordado, mesmo que ainda um pouco grogue.

Num momento em que todos decidiram se apegar a seus posicionamentos, com uma votação tão apertada, parece que a tendência mudou de zueira para brigas. Natural que aconteça, mas é preciso entender que levar a sério um assunto e criticá-lo não são necessariamente a mesma coisa, e, pelo contrário, que as duas coisas são completamente independentes, sendo a segunda a que deve ser o que guiar nosso pensamento daqui para frente, seja qual for o presidente.

17 outubro 2014

Playlist: Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor!

17 de Outubro, Dia Nacional da Música Popular Brasileira. Homenageia Chiquinha Gonzaga, reconhecida como a primeira compositora da MPB, que hoje é plural, abstrata, sem fronteiras, que vem de todos os cantos e tão representativa. Estilos e gêneros variados, transcendendo em épocas distintas, seja rock, techno, carimbó, forró, rap, ritmos afro-brasileiros, pop, experimental, tradicional.
Aquela geração [geração de 60] (apoiada pela TV, pelas rádios e pelo próprio público) enfrentou com inteligência a truculência de uma ditadura cruel, e se tornou clássica. Já a atual geração se desdobra para enfrentar outro inimigo, o capitalismo burro e sem escrúpulos, para sair de um gueto que, ainda que mostre sinais de evolução, está longe do reconhecimento merecido. E esse reconhecimento virá? Esperamos que sim. Esperamos. Enquanto esse dia não chega, a nova música brasileira está a sua disposição, a um toque do mouse. Não perca tempo. (Marcelo Costa)
Como diria os Novos Baianos, chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor. Não há nada mais significativo para isto se não for a produção artística histórica e atual da música popular brasileira. O Brasil como essência, não o virtual e inútil.

16 outubro 2014

Resenha - Under The Dome: 2ª temporada


Stephen King é responsável por boa parte do que se conhece de sci-fi pop americano. Obras literárias como Carrie, a Estanha e O Iluminado, de sua autoria, viraram grandes filmes, principalmente por dois motivos. O primeiro é que suas narrativas são sempre permeadas de metáforas sociais, que são transportadas para o que vem a ser o elemento sobrenatural ou de horror do elemento central da história. O segundo é que ele sempre se envolve no projeto cinematográfico de forma expressiva. Não é diferente em Under The Dome. A série, cuja segunda temporada foi exibida pela CBS, narra a história de uma cidade do interior dos EUA que é isolada por uma redoma, de origem e composição desconhecida. O funcionamento da narrativa segue bem à primeira regra, já que, para continuarem vivos, os moradores da cidade vão ter que reconstruir conceitos de sociedade e até de ecologia, quase como se a redoma formasse um mundo em miniatura, com consequências dos atos humanos muito mais instantâneas. A segunda também é válida: Stephen tem dedos, mãos e cabeça enfiados no projeto, chegando a escrever episódios inteiros dessa temporada. E isso é uma pena: não dá pra dizer que ele não teve controle do que está sendo construído.

Com um plot central tão promissor, Under The Dome acaba sendo o que se espera de uma série do seu gênero, provavelmente inferior, inclusive. Nomes como Stephen King e Steven Spielberg se acumulam na produção da série, e devem enganar a quem achar que são sinônimos de uma boa produção. Aqui, eles fazem apenas o que sabem fazer de melhor: um sucesso comercial. Under The Dome tem uma audiência grande e estável em seu horário, o que é ótimo para a CBS, mas para isso tende sempre a criar histórias pouco inovadoras para um público que já sabe o que esperar, mesmo se tratando de uma série sobre fenômenos misteriosos.

Desde Lost esse tipo de série é quase obrigatória na TV americana e segue bem a modelos já preestabelecidos. Nada de errado, desde que sejam feitos com qualidade. Os ganchos, que deveriam ser a principal ferramente desse tipo de programa, são aleatórios e por vezes até abruptos ou repetitivos, dando a sensação que eles não foram sequer pensados. O roteiro todo, aliás, é sofrível. Os personagens, cuja inconstância podiam ser um ponto forte do mistério, caem facilmente no esteriótipo já preestabelecido na temporada anterior, e quando mudam de personalidade é apenas para se encaixarem em algum papel de vilão ou herói do momento que precisa ser preenchido. Os diálogos não consegue aprofundá-los, e acabam sendo ou um grande falatório sentimental e místico sobre "o que a redoma quer ou não" - sim, aparentemente ela tem uma personalidade na série, a única desenvolvida, talvez.

O que resta de aspectos não negativos de Under The Dome não chegam a ser aspectos positivos, mas apenas OK, regulares. A série não acrescenta nada à gama de séries transgressoras que temos nesse momento da TV, e sua função é apenas fornecer entretenimento para o espectador que só quer distração e para a rede de TV que só quer reter o que ainda resta de público. Quase uma novela.




07 outubro 2014

Carta do Editor - Mês #5 Responsabilidade


"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas." Apesar de eu não gosto muito dessa frase, fato é que ela faz parte da infância de muita gente. Por que esse é, definitivamente, um dos valores - ou sentimentos, sabe-se lá - que mais cedo se recebe, desde pequeno. Responsabilidade. Em diferentes níveis, obviamente, de passar a poder dirigir, a ter que tomar conta dos irmãos, a até mesmo ter que ficar quieto para não fazer bagunça, o conceito de arcar com suas consequências é um dos mais fortes da nossa sociedade, sim, até hoje.

Ainda sim, há gente falando que nunca fomos tão irresponsáveis. E, por incrível que pareça, pode até ser verdade. A gente aprendeu que a responsabilidade é sempre de alguém, e que ela tem que ser lidada, mais cedo ou mais tarde. Faz muito sentido. O problema é que a gente nunca quer admitir que o problema é conosco. Ou a culpa é do outro, à la Sartre, ou a culpa é até da gente, mas "teve aquilo também que piorou tudo" ou "mas a culpa não é tão minha assim". Tanta aversão gerou um dos fenômenos mais malucos de hoje em dia, que é a pessoa que é preconceituosa, mas que se recusa a ser chamada de preconceituosa, por que assumir que o que você diz não é só sua opinião e que tem reações negativas na sociedade parece ser demais pra muita gente (mesmo não sendo o suficiente para passar a agir de outra forma)

O tema não vem por acaso. O período de eleições sempre desperta na gente a sensação que não temos muito como mudar a situação patética e desestruturada que nossa política vive há tanto tempo - desde que ele existe, talvez. A gente acaba votando no que já conhece, ou no menos pior, e os eleitos são praticamente os mesmos, seja pra bem ou pra mal. A estagnação do cenário político acaba igual, assim como em protestos e movimentos sociais, que historicamente não resultam em mudanças, e a gente acaba se sentindo meio culpado.

Tenho uma amiga que diz, em tom cômico, a seguinte frase: "Lide com as consequências ou as consequências lidarão com você". Pode parecer idiota (e a intenção é essa mesmo), mas ainda acho que ela traz aquela velha sensação que cada um de nós guarda, de que a irresponsabilidade é como um carma, que vai vir puxar o seu pé de noite e destruir sua vida. Como se tivéssemos sempre que tomar conta de tudo que está ao redor, que se não desmorona. Talvez seja por isso essa necessidade de estar sempre atarefado.

Acho que responsabilidade tem que ser encarada não como um lema de vida, não como uma constante, mas apenas como um elemento importante, assim como coragem e motivação, para o primeiro passo de se mudar alguma coisa. Quando se tem plena consciência do que deve ser feito, o objetivo deve ser o foco, e não o medo de não chegar até lá. É o que eu vejo em muitos adolescentes fazendo vestibular, por exemplo, em que um obstáculo a ser alcançado acaba virando um monstro inatingível por pressão - própria ou alheia - numa situação em que algo que era pra ser difícil e positivo de se conseguir se amplifica em algo impossível e indispensável.

Depois de tanto atraso com a carta desse mês, a responsabilidade bateu e resolvemos falar justamente dela, desmistificá-la para entender que ela ela não é um bicho de sete cabeças, nem uma tia chata que te dá bronca, mas na verdade algo indispensável para que, como indivíduos, possamos crescer.

24 setembro 2014

Dota 2 Vs. League Of Legends, Fight!


Após a magnifica disputa entre os clássicos Mario e Sonic, seria essa a maior rivalidade entre jogos da atualidade? Será que realmente algum desses dois MOBAs ( Multiplayer Online Battle Arena, ou Arena de Batalha Multiplayer Online em português ) tem uma superioridade perante o outro? O fato é que muitos participam dessa confusão, mas poucos realmente sabem de verdade os reais atributos de cada jogo, confira já, e não seja mais uma dessas pessoas.

 Dota 2 
Sendo o grande veterano do estilo MOBA, o mesmo deu início ao gênero. Tendo na sua segunda versão, uma enorme mudança nos gráficos, onde teve os aspectos 3D muito mais trabalhados que a versão anterior.

Seu período de teste foi muito extenso, dando espaço assim para o lançamento do seu grande rival: LoL, o famoso League of Legends, no ano de 2009. Seu principal inimigo absorveu a legião de fanáticos por Dota 1 que já estavam de saco cheio de tanto aguardar ansiosamente para que o título fosse então, finalizado. Quando Dota 2 foi lançado,já era tarde demais e não conseguiu recuperar todos os seus fãs perdidos para o concorrente, porém, menos popular, Dota permanece imortal. 

League Of Legends 
Desde o seu marcante lançamento até os dias de hoje, "LoL" ( League Of Legends ) definiu um marco na linha do tempo dos MOBAs. Mesmo tendo seus gráficos inferiores, roubou a legião massiva dos jogadores de Dota e hoje é o título mais jogado. Existem diversas críticas á respeito do título e inclusive dos fãs ( que muitas vezes são questionados inclusive pela opção sexual, algo sem nexo algum ), sendo uma delas sobre a opção de gastar dinheiro comprando skins e outros itens no jogo, que é algo que fica á critério do jogador e é voltado apenas para o aspecto da aparência. Porém, isso terminou sendo uma das coisas queridas pelos jogadores do título, por permitir uma gama de personalizações para seus personagens.

Mas afinal, quais as Igualdades/Diferenças entre eles? 
Ambos têm diversos aspectos que se igualam, e outros que se diferenciam bastante, deixando muitos confusos, porém, vale relembrar seus aspectos que diferem ou não, confira:

Semelhanças: 

Objetivos principais (resumidamente) :
Dota 2 – Destruir a base inimiga.
League Of Legends - Destruir a base inimiga.


Mata Competitivo :
Dota 2 – Três rotas principais, com algumas ligações e protegidas por torres.
League Of Legends - Três rotas principais, com algumas ligações e protegidas por torres.
Podemos perceber que a “essência” dos dois é a mesma, tendo os mesmos objetivos e tipos de mapas.

Diferenças: 
Acesso ao LoL:
  • Acessar o site do LoL 
  • Criar conta no LoL 
  • Baixar o LoL 
  • Atualizar o LoL (se necessário) 
  • Iniciar o LoL 

Acesso ao Dota 2:
  • Acessar o site da Steam 
  • Criar uma conta na Steam 
  • Baixar a Steam 
  • Iniciar a Steam 
  • Adicionar Dota 2 á biblioteca da Steam 
  • Baixar Dota 2 -Atualizar Dota 2 (se necessário) 
  • Inicar Dota 2 

Como podemos conferir, o acesso ao LoL é bem mais prático e fácil do que ao Dota 2, já que nem todos têm acesso a uma conta na Steam, resultando na grande quantidade de jogadores do League Of Legends. Existem outras diferenças, como:

O mapa de Dota 2 é maior que de League Of Legends resultando em partidas mais longas.

Em Dota 2, seu personagem perde ouro ao morrer, enquanto em League Of Legends isso não acontece.

League Of Legends é um pouco menos caótico e mais fácil de aprender do que seu concorrente Dota 2.

A plataforma que “abriga” o Dota 2 é a Steam, a maior plataforma de comércio de jogos do mundo , sendo assim , os jogadores terão menos chances de criar contas apenas para “bagunçar” o jogo.

A segurança de Dota 2 fica por conta da Valve, tendo assim uma superioridade em questões de servidores e segurança, por ser uma empresa de grande porte.

As configurações mínimas de League of Legends são mais acessíveis do que as de Dota 2, aumentando o número de jogadores.

 Mas, quem ganha essa batalha? 
Não adianta alegar que LoL é mais famoso, ou que Dota 2 é mais seguro e antigo. O fato é que esses dois títulos têm aspectos bem diferentes, e outros bem parecidos, o que deve ser avaliado é aquilo que mais te agrada, e assim fazer a sua escolha, ou quem sabe até, jogar os dois ao mesmo tempo? Sendo assim, escolha seu MOBA ( ou seus MOBAs ), e boa sorte!

20 setembro 2014

Links de Sábado #9

HOJE EU QUERO VOLTAR COM OSCAR
A gente só não tinha falado de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho ainda porque o filme saiu no período de hiato do blog e não houve ainda um momento exato em que ele se encaixava. Essa semana, porém, saiu a notícia que o filme é o selecionado para representar o país na disputa pelo Oscar, o que é uma ótima notícia. Primeiro porque é uma ótima representação, já que a quantidade de prêmios que ele já ganhou pelo mundo não é bobagem. A lista já passa dos 20, contando 3 prêmios só no festival de Berlim, onde o filme estreou, entre eles o Teddy Awards, principal premiação LGBT do mundo, ganhando de filmes americanos e franceses. Isso sem contar que recebeu prêmio de melhor filme em quase todos os festivais que participou pelo mundo afora. Além disso, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho representa uma nova possibilidade ao cinema brasileiro, que costuma se limitar tanto em temática, quanto em formato. Pra quem não viu o filme ainda dá pra baixar no iTunes, no Google Play e também dá pra comprar o DVD "pirata oficial", que a própria produção do filme tá vendendo bem baratinho, só R$10. Pra quem já viu só basta ver de novo e torcer pra que o filme seja indicado, já que é algo que não ocorre com um filme brasileiro desde 1999, com Central do Brasil.



BUTTON POETRY
Não que seja nenhuma novidade, mas essa semana eu descobri o canal Button Poetry no Youtube. O canal, que é em inglês (desculpa, nem legenda em português tem =/) é um compilado de poetas recitando seus poemas em eventos. O interessante é que os poemas são contemporâneos, em sua maioria escrito por jovens, e todos com forte representação de diversidade. Basicamente todos os vídeos são muito bons, mas só para você ter uma ideia indico Friend Zone, de Dylan Garity, que questiona a validade do termo a partir das próprias experiencias com ele; OCD, de Neil Hilborn, que narra a obesessão de um homem com TOC por sua namorada; Piñata, de Pages Matam, em que o autor desconstrói a cultura de estupro a partir de um comentário que ouviu no ônibus; To JK Rowling, from Cho Chang, de Rachel Rostad, em que a poeta critica a representação de mulheres asiáticas na cultura pop a partir da personagem de Harry Potter; Dear Straight People, de Denice Frohman, um hilário poema sobre verdades não ditas sobre homossexualidade; e meu favorito, Shrinking Woman que está abaixo, um poema sobre como a nossa sociedade reduz as mulheres, não só psicologicamente como também fisicamente. O legal é não só ver belos poemas mas também a ótima performance que os autores dão e a sempre entusiasmada reação da plateia. Vale muito a pena ficar horas fuçando o canal.


COVER DA SEMANA
Eu geralmente não sou muito fã do Jason Mraz, mas sou muito fã de Lennon and Maisy, essas duas meninas que basicamente tudo que tocam vira ouro. Elas são extremamente fofas e as versões delas de Call Your Girlfriend, Hey Ho e I Won't Give Up delas são incríveis. Foi por essa ultima que elas foram chamadas pelo intérprete da música, Jason Mraz, pra participar de um show cantando a música. O vídeo no Youtube tem não só a versão como também os ensaios e os bastidores, tudo junto.

15 setembro 2014

Os Sertões e sua importância literária, histórica e reflexiva

Quando se fala de história levando em conta a literatura não se pode ignorar um clássico brasileiro, pré-modernista e também dos vestibulares.
"Os Sertões" de Euclides da Cunha. Um livro que possibilita um entendimento em áreas como antropologia, sociologia, geografia, geologia, história... Do Nordeste Brasileiro, porém história não é simplesmente comprovação de erudição, ela é reflexão do passado e presente (E por que não do futuro?).

"Os Sertões" é dividido em três partes "A Terra", "O Homem" e a "A Luta". Na primeira, como o próprio nome já diz, ele fala da formação geográfica Nordestina; na segunda, a formação dos mestiços; e na terceira, Euclides detalha as expedições de extermínio executadas contra Canudos.
Livro "Os Sertões" de Euclides da Cunha
Publicado pela editora EDIOURO
Os Sertões começou a ser escrito primeiramente com o objetivo de ser uma matéria para o jornal "Estado de S. Paulo", mas o que era pra ser uma expedição jornalística se tornou em uma obra-prima que desmistificou tudo o que a mídia contava sobre Canudos.

Quando o autor foi para Canudos fazer a matéria sobre o arraial, já partia com opiniões formadas (Opinião disseminada pela mídia da época), mas ao chegar no arraial viu que tudo era completamente diferente, o que era dito como restauração da monarquia era na verdade um movimento social e revolucionário com base religiosa promovida por Antônio Conselheiro (Líder do movimento de fundação de Canudos) contra a república autoritária e opressora.
Gravura feita em Xilogravura retratando os discursos
que eram feitos por Antônio Conselheiro por onde o
agitador revolucionário passava.
Voltando ao início do texto... A reflexão do nosso presente e futuro surge principalmente nesse ponto da obra. A mídia disseminou ódio contra a revolta popular que crescia. E dissemina contra as que crescem na atualidade sempre a favor da burguesia (O que ela representa) e enquanto não nos reconhecermos como susceptíveis a diferentes manipulações midiáticas, continuaremos na inércia ignorante que Euclides outrora esteve. Cazuza em 1988 já dizia "Eu vejo o futuro repetir o passado" e esse passado ainda se repete nos nossos anos "2000", por isso a leitura da história como reflexão da atualidade é essencial para uma renovação política e ideológica.

Gravura extraída da adaptação para quadrinhos de "Os Sertões".
Retrata a terceira parte do livro "A Luta". 



Além da questão da mídia, pode se destacar a resistência brava dos sertanejos contra os soldados da república que bem armados, invadiram as terras nordestinas com uma missão de extermínio.
Os sertanejos lutaram junto a sua terra (talvez sem o conhecimento de que lutavam junto a ela), mais ou menos como os Russos fizeram contra o exército de Napoleão e a União Soviética fez contra o exercito de Hitler, o conhecimento do seu ambiente propiciou aos sertanejos ganharem algumas expedições.
Os soldados (Como sempre peças de xadrez controlados por burgueses, feitos para manter a classe baixa na comodidade nada cômoda) não aguentavam o calor que o sol do sertão nordestino aplicava sobre suas roupas pesadas deixando-os assim exaustos...

Mas nem tudo em Os Sertões é um "mar de rosas"... Por Euclides da Cunha ser de uma época em que se negava a mestiçagem do branco com demais cores e etnias, durante "O Homem" são descritas várias notas racistas com termos como "raça superior" e "raça inferior", porém é notável uma contradição... A medida que se ler a obra se percebe também uma mudança de ideia do autor, (É a questão da análise e reflexão que devemos nos cobrar) Euclides passa a admirar o sertanejo, principalmente pela sua disponibilidade de luta pelo que acredita que se deve lutar.
“A raça superior torna-se o objetivo remoto para onde tendem os mestiços deprimidos e estes, procurando-a, obedecem ao próprio instinto da conservação e da defesa.” (Página 49 – Os sertões)
O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral. (Página 51 – Os sertões)
Acima exemplos dessa contradição e mudança de ideia que é percebida durante a leitura.

Além dessa estética de "Os Sertões", Canudos pode ser considerado um dos grandes eventos mundiais.
Canudos representa para toda classe comunista e anarquista a realização da utopia (utopia?).
Foi a consagração de um movimento revolucionário e puro, onde a existência humana, com o coletivismo e irmandade tornou-se a saída para a opressão da república, e por sair das garras opressoras dos dominantes foram covardemente exterminados. 
E o povo de Canudos? Representaram e representam "A rocha viva da nossa raça".

Cena final da adaptação para o cinema 
da história de Canudos. Dirigido por Sérgio Rezende. 

05 setembro 2014

Resenha - Amores Inversos (Hateship, Loveship)


A primeira coisa que se pode dizer sobre Amores Inversos, adaptação do conto Ódio, Amizade, Namoro, Amor, Casamento, de Alice Munro, atual ganhadora do Nobel de Literatura, é que é, definitivamente, inesperado. Não só pela atuação dramática como protagonista da Kristen Wiig, de comédias como Saturday Night Live e Missão Madrinha de Casamento, mas também porque é um desses filmes que não é possível resumir a história numa sinopse. Os fatos que acontecem, apesar de muito bem amarrados, não seguem a linha óbvia com a qual nos acostumamos, com desenvolvimento, clímax e tudo mais, e é difícil até mesmo definir a qual o gênero ele pertence.

Para aqueles que não leram o conto e preferem ficar sem spoilers, o pouco que dá pra dizer é que o filme conta a história de uma mulher que é cuidadora de idosos e que, depois da morte da mulher para quem ela trabalhava, vai ter que cuidar de uma adolescente que mora com o avó ausente e cujo pai está tentando reconstruir a vida em outra cidade. A partir daí, o desenvolvimento de tramas e acontecimentos se dão num efeito dominó. Essa forma de escrita, em que uma cena leva à outra, ao invés de serem conectadas por ganchos, dá ao filme uma noção completamente natural. É graças à história ser tão boa, porém, que, diferente de muitos filmes indies com o mesmo modelo, o filme não parece ser ser rumo. Ainda sim, isso não significa que se trata de um filme fácil.

A reconstrução parece ser o que norteia esse filme, não só pela estrutura do roteiro. A já citada atuação de Kristen Wiig é tão bem dosada, que é difícil de acreditar que a atriz é comediante ao invés de reclusa e comedida como a personagem. Toda a história vai, a cada cena, em uma direção completamente nova e inesperada, mas ao mesmo tempo o clima estético do filme é sempre de corriqueirismo, dando a impressão de se tratar de uma história comum de pessoas reconstruindo suas vidas, dessas que ouvimos da avó sobre um parente num domingo de almoço.

O grande trunfo do filme é esse: mostrar histórias que parecem beirar à realidade e que, apesar de serem difíceis de funcionarem, passam a dar certo ao longo do tempo. É uma visão diferente da que geralmente filmes imersivos à realidade alheia passam, em que mostrar a realidade vira sinônimo de comover a partir do infortúnio alheio. A oposição que Amores Inversos faz a essa visão é tão suave, que não se oporia a ela até o mais pessimista. Só basta saber se ele não se incomodar com um filme que, apesar da história nada extraordinária, é tão pouco comum.

02 setembro 2014

Carta do Editor - Mês #4 História

A História, como ciência que analisa o homem e indivíduo e ser social com enfoque em seu desenvolvimento no tempo, não apresenta uma maneira única e definitiva do que aconteceu. Um mesmo fato histórico pode haver várias interpretações ao longo do tempo, sendo construída com informações que têm autores e intenções distintas. As maneiras de olhar para o passado mudam de acordo com o presente, constantemente sendo atualizado.

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No século XIX, se tinha uma historiografia totalmente limitada a interesses políticos e da classe dominante. Só eram aceitos documentos oficiais e outras formas de tentativa evidenciar um fato foram ocultadas, desimportando as outras civilizações e culturas, sem a possibilidade de ampliação do campo de problematização.

Esta concepção foi mudada com o desenvolvimento da Ciência, e hoje, já se tem inúmeras possibilidades de fonte histórica. Fotografia, pinturas, relatos orais, livros literários, utensílios do cotidiano, monumentos, objetos, e dentre outros. Há muito mais liberdade, podendo dar a mesma atenção aos fatos que aconteceram, principalmente aqueles que fluíram de forma orgânica.

Pensando nisto e por ter participado no dia 30/08 do VII Recital de Poesia de Santo Amaro - BA, que nesta edição homenageara Zilda Paim, tive a ideia de compôr esta carta do editor com o tema História e não tratá-la somente como Ciência, e sim como artifício de grande valor para a sociedade em geral.

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Quem acompanha o blog ou leu as postagens mais precisamente do mês passado, pode perceber facilmente minha queda por esta cidade. Mas não é atoa não. Nesta falarei apenas de uma pequena parte (de grande valor) de Santo Amaro, que foi Zilda Paim e sua importância para história e formação intelectual.

Zilda morreu ano passado, infelizmente não pude conhecê-la. Na época não conhecia direito seus feitos, tampouco quem foi, mas sabia que era um nome de grande importância. De forma sintética, foi educadora, folclorista, pintora e historiadora.

Revelou que sempre teve curiosidade sobre as coisas da cidade e sentia ciúme de ter passado a vida toda lendo sobre a história de outros lugares e não tinha muito como saber sobre Santo Amaro."A curiosidade é a verdadeira alma da civilização" (Machado de Assis). Por conta disto, passou a recolher informações, catalogar e documentar qualquer coisa que achava importante.

Professora por mais de 50 anos, especialista de renome internacional em maculelê, foi a primeira mulher Presidente da Câmara de Vereadores e tem um quadro da Prefeitura e da Igreja Matriz de Santo Amaro exposto em uma galeria em Nova Iorque. Se dedicou muito ao folclore e em suas aulas, tratava de temas bastante questionadores, isto por volta da metade do século passado, época marcada pelo conservadorismo. Progresso, escravidão e preconceito, cultura e arte, dentre outros.

Não fez faculdade de Belas Artes, nem de História, porém é tratada como pintora e historiadora. "Os amores na mente, / As flores no chão. / A certeza na frente / A história na mão". (Geraldo Vandré). Portanto, sem este conhecimento da história, seja como Ciência ou como abstração, a humanidade estaria alheia a qualquer coisa. Não se deve deixar para trás e achar irrelevante a cúpula cultural construída pelo tempo.
[Imagens retiradas do blog Zilda Paim]

31 agosto 2014

Technochic Mixtape

A mixtape desse fim de mês não é assim tão nova. A mixagem foi feita grande parte há mais de um ano e acabou ficando arquivada no computador. Com o conteúdo do mês, em que se discutiu reformas de conceitos culturais, me pareceu adequada tirar a poeira dela, que a essa altura já é a minha favorita de todas as mixtapes, e dar os acabamentos finais. Essa mixtape é inteira de Technobrega, mas não só do jeito que muitos podem imaginar: têm desde remixes de músicas internacionais, a baladas de artistas experimentais paraenses. Apesar disso não vai faltar, claro, hits das bandas mais consagradas que a gente decorou a letra de tento tocar no rádio. Apesar do tema estar sendo abordado no blog só agora, essa não é a primeira vez que publicamos uma mixtape de música popular e de periferia: tem também a The Deselegante Mixtape, que diferentemente dessa, tem uma proposta muito mais zueira (mas não deixa de ser bem legal). Mas deixe para conferir ela depois, melhor deixar de enrolação, dar logo esse play e tremer muito!Pra baixar a mixtape é só clicar na setinha na parte superior direita do player. E para ouvir todas as mixtapes, conhecer as músicas usadas nas setlists e seguir a gente, vai lá no nossos acervos de SoundCloud (12 e 3)

30 agosto 2014

Cultura de periferia

Geralmente quando se fala de funk, arrocha, brega e afins, sempre tem alguém que torce o nariz, alegando "não ser cultura", ou que é "vulgar". Essas pessoas, por comumente encontrarem esse pensamento disseminado, o aceitam como verdade e pouco questionam de onde vem tal pensamento.

Há tempos atrás não conseguia parar de pensar nisso. Todo mundo dizia que esses ritmos eram invariavelmente ruins, mas o que tornava eles ruins?  Alguns diziam ser os ritmos, mas logo percebi não ser o caso. O funk, por exemplo, é uma música eletrônica única no mundo, que diferente da maioria dos subgêneros de eletrônico, que são tonais, é basicamente percussiva, usando samples que misturam sons sintéticos com os batuques brasileiros, e às vezes pegando algum outro elemento gravado, sendo quase que uma forma artesanal de produção do ritmo.

Passando essa questão, muitos disseram serem as letras o problema. Os funks "proibidões" são carregados de palavrões, e até alguns mais leves usam muita conotação sexual na música, o que leva muita gente a desconsiderar a validade lírica do ritmo perante ao MPB, por exemplo. É bom lembrar que música não tem um propósito único: pode falar de questões sociais e políticas, de questões metafóricas, de questões sentimentais e românticas, ou pode fazer dançar e servir para entreter também. Esse ultimo é o caso da maioria dos funks. Mas não de todas as músicas de periferia: o arrocha e o brega, por exemplo, geralmente retratam mais de amor. E, como em todo estilo, existem letras mais ou menos desenvolvidas com menor ou maior teor expressivo dentre as milhares músicas do estilo, e portanto, generalizar é só uma tentativa de descartar a validade ritmo.


Foi então que descobri, não no ramo da cultura, mas da linguística, um cara chamado Maurizio Gnerre. Ele estudava variação linguística, tentando entender como a língua mudava tanto de lugar pra lugar e de grupo social pra grupo social, e como algumas dessas variações podiam ser mais "erradas" que outras, de acordo com o censo comum. Ele chegou a conclusão que não existia como você dizer quantitativamente se um grupo variava mais ou menos da norma padrão, ou seja, não tinha essa de "falar errado" e "falar certo", é tudo linguagem coloquial. Foi aí então que ele percebeu de onde vinha a relação de valor da língua:
"Uma variedade linguística 'vale' o que 'valem' na sociedade os seus falantes, isto é, vale como reflexo do poder e da autoridade que eles têm nas relações econômicas e sociais"
Ou seja: o que faz certa fala ser considerada errada em nossa sociedade não é porque ela é gramaticalmente, sintaticamente ou culturalmente menos expressiva do que outra, mas simplesmente porque ela associada a um grupo mais excluído. E, perceba bem, essa afirmação vale não só para linguística, como também para cultura como um todo.

"Mas você não pode estar me dizendo que funk é bom!! Eu ouço, e não gosto!" Sim, é exatamente isso que estou dizendo. Assim como muitas ideias instauradas em seus respectivos períodos, como a escravidão racista e os jogos de gladiamento na política de Pão e Circo romana, as pessoas tentem a normativizar padronizações como regulares. A música da periferia não é ruim porque traz elementos pouco originais ou de menor importância, mas sim por que o conceito de bom gosto e refinamento cultural sempre esteve atrelado às elites, seja nas referências de como é a música "boa"e "ruim" de cada época, ou seja nas teorias acadêmicas, que apesar de abraçarem, sim, certos movimentos antigamente marginalizados, como o samba e a capoeira, só o fazem depois que eles deixam de representar uma resistência ao modelo sócio-cultural vigente e se transformam em uma incrementação folclórica desse modelo, que persiste inalterado.


Nesse momento invejo os EUA, que apesar de ainda ser um país de forte divisão social e de muita prática de apropriação cultural, soube investir em movimentos de grupos minoritários, transformando-os em grandes movimentos culturais do mundo todo. O rap é um ótimo exemplo, pois assim como o funk, ele surgiu de batidas sampleadas e letras não-cantadas, de estruturação bem simples e pouco familiar até aquele momento, sem contar que muitas vezes falava de assuntos agressivos e usava palavrões nas músicas. Isso não impediu, diferente do funk, do ritmo ter investimento de grandes gravadoras, ser consumido pelo grande público como qualquer outro ritmo, tocando em canais de música e festivais, consagrando-se hoje como um dos ritmos mais influentes atualmente - se não o ritmo mais influente - , com um passado cheio de ícones, sucessos e obras consagradas, e com artistas cada vez mais desenvolvendo o ritmo numa linha experimental/culta, como é o caso do Kanye West.

Ao contrário disso, os artistas de funk, brega, arrocha, rasteirinha etc. são, em sua grande maioria, independentes, tendo que construir modelos econômicos e de distribuição completamente novos só para se manterem na ativa (modelos muito interessantes, talvez gerem um post mais tarde). Aqueles poucos que conseguem chegar a uma gravadora têm, geralmente, as características musicais apagadas, trocando as batidas do funk pelas do EDM e mudando as letras. As poucas exceções podem ser contadas nos dedos, como é o caso de Gaby Amarantos.


A música e cultura pop nunca se consolidaram no Brasil, diferentemente da América do Norte, Europa e Japão, justamente porque temos tantas outras formas próprias de cultura popular que são muito influentes, mesmo que ainda mal exploradas. Passar a ver essas formas culturais com outros olhos é o primeiro passo para termos uma indústria cultural consolidada, podendo competir com outras que influenciam tanto o mundo. Provas disso são: o sucesso que essas músicas fazem fora do país, onde chegam como música alternativa, sem o valor depreciado que tem aqui dentro; e também como elas viraram matéria-prima para a produção de artistas de outros estilos, como Curumin, Gal Costa e Lucas Santtana, expandindo os horizontes e os limites do que é possível de fazer com essas músicas.

É absurdo num país como o Brasil, em que a diversidade é uma das bandeiras que carregamos, que o preconceito cultural ainda dite como abordamos a nossa produção perante às estrangeiras. E, claramente, só nós que perdemos com isso.